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Posts Tagged ‘Fabrício Carpinejar’

Para um dia especial como o de hoje nada mais natural que inspirar-se com poesia e sentir a presença da pessoa amada ao lado. Feliz aquele que ama (e é correspondido) ter a experiência de uma convivência de amor, harmonia e cumplicidade. Posso dizer que eu tenho esta sorte. Há vinte e dois anos tenho ao meu lado a mulher da minha vida e a ela dedico este poema. Sei que o grande poeta Fabrício Carpinejar não vai se importar que eu use suas palavras deste belo poema para expressar aqui o sentimento que me vai ao coração.

Para ti, Denise. Minha amada imortal.

 

UM COQUE GRISALHO PARA MINHA VIDA

 

Há homens que se imaginam com mechas loiras entre as mãos. Cabelos morenos, lisos, brilhantes. Cabelos cacheados, perfumados. Cabelos ruivos, intensos. Cabelos coloridos, disfarçados. Cabelos encharcados de vigor. Cabelos para dizer o quanto são jovens, o quanto são viris, o quanto são sedutores.

Eu me pressinto com um coque grisalho entre as mãos. O cheiro de tecido alisado com vapor. Ou da madeira encerada de varanda. Um coque caprichado, com toda a brancura de um inverno na serra. Um coque como uma cesta de laranjas desembarcando na fruteira. Um coque como um ninho, o ninho já é jardim e quintal para o pássaro.

Um coque grisalho como um novo ombro para a janela. Um coque grisalho e até o vento respeita. Um coque ao alto, como uma lâmpada que não se queima, que não depende de escadas.

Não é nenhuma perversão. Enxergo-me desde agora segurando os cabelos brancos de minha mulher. Envelhecido com ela, sem mentir a natureza de minhas sobrancelhas e esconder a fragilidade de meus braços. Fico excitado em estar com alguém que madurou e não perdeu o viço. Respeitar quem amo e amar quem respeito. Poder errar as lembranças para recuperar o desejo. A coragem de avançar para trás, não terminando de musicar a memória e de acrescentar datas.

Um coque grisalho entre os dedos já afinados de flauta. Os cabelos armados pelo costume de soltá-los somente na cama. Ver minha mulher se pentear de manhã, devagar, namorando o espelho como se o meu rosto fosse sempre perto daquele rosto. Seu apuro de ouvido, definindo se o cabelo está pronto pelo barulho fácil do pente.

As linhas dos lábios desenhadas pelo batom suave. Nenhum escândalo diante do tempo, nenhum pavor de mortalidade. A mesa da sala limpa de alegria e sofrimento. Limpa, com um vaso a mostrar seu centro. Nossas vozes dentro das vozes dos filhos dentro das vozes dos netos. Enganar o nome de quem chega. A amizade de entender as manias e não sacrificá-las com o julgamento. A maior aventura não é correr o mundo, é correr os olhos, aventurar-se pelo interior da casa.

Não desejo a juventude de uma mulher, desejo sua permanência. O que a faz recente não é o quanto ela se preservou, mas o quanto ela se entregou.

Fabrício Carpinejar

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